domingo, 10 de julho de 2011

Devemos Pegar Dinheiro da Encruzilhada? E se for um Salário Mínimo?

Olukó Brad Pághanni de Oxalá


            Esta postagem necessita de atenção e reflexão na hora da leitura. Pelo menos esta, não leia correndo.
 É mais ou menos um conto. É como se fosse o "Mito da Caverna" de Platão.


                                      A FÉ DE UM JOVEM À PROVA DE FOGO
           
            Os grandes fundamentos do mundo e da espiritualidade em geral – partem das indagações... Das perguntas, dúvidas.

Brad de Oxalá
            Talvez essa seja uma das postagens mais interessantes que já fiz no blog da Sociedade Candomblé Moderno. O tema parece bobo, mas, no decorrer da matéria vocês verão que a questão é muito mais complexa do que se possa imaginar.

            Todos nós sabemos das condições dos brasileiros. Muitos ganham apenas um salário mínimo e conseguem sobreviver (são mágicos). Sabemos também que, este país – tem em sua grande maioria – pessoas de diversas ideologias religiosas, ecumênicos. Não podemos nos esquecer também dos ateus.

            É muito comum vermos nas encruzilhadas, despachos. Seja ele qual for – com galinha, sem galinha, com vela, sem vela, com moedas, sem moedas. Mas, há pouco tempo eu fiz um teste comigo mesmo e com algumas pessoas. Um teste curioso e que põe à prova de fogo a nossa fé e devoção aos deuses e aos ancestrais. No ramo da sociologia e da filosofia, este teste é considerado um “Experimento Mental”, ou seja, aquele teste em que nós inventamos uma situação, capaz de ser real ou não, e que depois tiramos conclusões sobre as nossas reações caso essas situações fossem verdadeiras, concretas.

            Pensando comigo mesmo:
            “- E se eu estivesse passando por uma encruzilhada, de ruas movimentadas, e visse ali um despacho com um salário mínimo... Será que eu pegaria?”

            Mesmo sabendo que ali há uma energia, e que eu não necessito tanto de um dinheiro extra; e também – que acredito nos Orixás e nos ancestrais, minha resposta para mim mesmo foi:

            “- Sim, é lógico! Eu pegaria! Se eu não pegasse, um gari da prefeitura pegaria. E se um gari da prefeitura não pegasse, outra pessoa pegaria. Então, que mal faria? Pegaria sim!”

            Essa questão ficou martelando em minha cabeça.
            Então, decidi perguntar a outras pessoas de mesma fé que eu. Uns disseram que pegariam. Outro, até xixi na mão faria. Outra disse que, se um sacerdote arrumasse alguém que estivesse disposto a fazer tal oferenda, mais tarde, tendo ciência do ocorrido, o sacerdote passaria a mão no dinheiro. Outro, um tanto mais justo, pegaria o dinheiro e depois daria um agrado à energia que estivesse ali, no despacho.
            Entretanto, essas respostas não foram maldosas. Eles foram sinceros, e isso não prova que são descrentes ou desonestos. Simplesmente deram suas opiniões.

            Vendo essas afirmações, logo pensei:
            “- É! Eu também pegaria”.

            Toda via, outras duas questões martelavam em minha cabeça:
            1 – “Não. Eu não pegaria. Pode ser que Exú esteja testando a minha fé”.
            2 – “Sim. Eu pegaria. Pode ser que Exú esteja me oferecendo aquele dinheiro”.

            Pensando mais um pouco, a idéia de pegar o dinheiro se tornara mais forte do que não pegar o dinheiro. Entretanto, me senti receoso e com uma espécie de remorso, ou medo, e então – busquei outra fórmula mais convincente para não pegar o dinheiro, a final, o que me motivaria a pegar o dinheiro é que – um gari, ou catador de papelões e latinhas pegaria. Então, pensei pelo lado, digamos que, político e ético da coisa:

            “- Detesto pastores corruptos. Não detesto pastores. Detesto pastores corruptos. Pastores que vendem a suposta palavra de deus e que no final do culto comemoram o dinheiro arrecadado. Detesto Edir Macedo. Ele chegou a ponto de ensinar seus subordinados a conquistar fies e arrancar dinheiro – o máximo que possível. Não! Eu não serei como um homem desses. Todo mundo fala. Todo mundo condena, principalmente os que não são cristãos. Principalmente os candomblecistas”.

            Se eu pegasse o dinheiro, eu não estaria sendo como um religioso corrupto? Tudo bem... Eu não estaria roubando ninguém, e nem estaria enganando as pessoas oferecendo salvação.

            Mas, se eu pegasse, eu estaria sendo descrente de minha fé?
            E se eu não pegasse, eu estaria sendo burro?

            Eis o paradoxo!

            Logo depois, as idéias foram se tornando esclarecidas...
            Agora vem o mais interessante:

            A idéia de que eu pegaria o dinheiro, 540 reais da encruzilhada, parte do princípio da liberdade. A rua é um local público. Achado não é roubado. Quem deixa na rua não pode ser considerado roubado... Está na rua por vontade do ex-dono!

            Mas, será que a rua altera uma energia?
            Aí, vocês me perguntam:
            - Mas, Brad, como assim?

            Digo no sentido de essência: será que uma energia que está na encruzilhada merece menos respeito que outra energia assentada em um barracão?

            Fazendo esta pergunta para mim mesmo, a primeira resposta que veio à minha cabeça foi: NÃO.

            Na veracidade dos fatos, exú é exú aqui e em qualquer lugar. Exú é exú na encruzilhada ou assentado em um barracão. Eu estaria totalmente errado se eu chegasse em um assentamento, dentro de um barracão e metesse a mão nas jóias de uma pomba-gira assentada!

            Logo, cheguei à conclusão de que – a diferença de tirar uma “riqueza” ou algo valioso de um exú ou uma pomba-gira de rua ou de barracão é nula. Não há diferença na lei da espiritualidade, e sim, na lei dos homens. Eu seria preso por furto (artigo 157 do código penal brasileiro).

            Mesmo depois de ser tentado por 540 reais... Um salário mínimo, eu cheguei à conclusão que eu não pegaria o dinheiro. Mesmo que depois eu morresse de remorso, eu não pegaria.

            No início desse Experimento Mental eu me senti até entusiasmado com a idéia de que seria legal achar um salário mínimo na encruzilhada. Mas, no final, vi que não vale a pena trair a minha fé...

            Afinal “Exú é vento. Exú é exú aqui e em qualquer lugar. Na rua ou no assentamento. Exú, pra sempre Exú!”